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31/05/2024 às 16h35min - Atualizada em 31/05/2024 às 16h35min

A magistocracia: Lula ressuscitará “saidinhas” e crime de “fake news” no STF

Deltan Dallagnol afirma que a nossa democracia está cada vez mais parecida com uma ditadura de magistrados togados que nunca receberam nem um voto sequer nas urnas

Deltan Dallagnol / Don Carlos Leal
R7
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro do STF Alexandre de Moraes. - Foto: EFE / André Borges / Reprodução
A sociedade brasileira teve duas grandes e importantes vitórias na última terça-feira(28), no Congresso Nacional. A primeira delas foi a manutenção do veto 46/2021, do presidente Jair Bolsonaro, que barrou a criação do crime de fake news, que restringiria ainda mais a liberdade de expressão dos cidadãos, com pena de prisão de até cinco anos para conteúdos legítimos, mas críticos a Lula, que já foram derrubados pelo TSE como “fake news”. Na sessão conjunta do Senado e da Câmara dos Deputados, o veto de Bolsonaro foi mantido por 317 votos contra 139 dos governistas.

A segunda vitória foi a derrubada do veto de Lula ao projeto de lei que acabou de vez com as “saidinhas” temporárias dos presos, um verdadeiro bueiro destampado para novos crimes contra cidadãos inocentes. Imediatamente após as derrotas do governo Lula serem anunciadas no Congresso Nacional, a esquerda e jornalistas da grande mídia começaram a noticiar quais serão os próximos passos do governo para ressuscitar ambas as pautas, que naufragaram de maneira acachapante no Congresso Nacional.

A estratégia não poderia ser outra: acionar o Supremo Tribunal Federal (STF), tribunal alinhado até a medula com o governo Lula, para reverter as derrotas e impor no tapetão à população brasileira mudanças legislativas que o Congresso já rejeitou. É o judicialismo de coalizão do governo Lula em modo turbo.

Em relação ao fim das “saidinhas” temporárias de presos, o governo estuda ações diretas de inconstitucionalidade, que podem ser ajuizadas por partidos políticos ou pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para buscar, no Supremo, uma declaração de que o fim das “saidinhas” é inconstitucional.

Basta o governo Lula, por exemplo, acionar os partidos de esquerda satélites do PT para que entrem com a ação no Supremo, como eles já fizeram naquela ação que pretende derrubar de vez todos os acordos de leniência da Lava Jato, acordos esses que os partidos de esquerda, que dizem defender os pobres e os trabalhadores, agora dizem terem sido celebrados sob um “estado de coisas inconstitucional”. Deve ser um caso único em democracias modernas em que partidos de esquerda, socialistas e comunistas defendem os interesses de grandes empreiteiras e empresários bilionários.

Na quarta-feira(29), a CNN cravou que já há uma maioria no Supremo para derrubar a decisão do Congresso de dar um fim às “saidinhas”. Ministros do STF, que já afirmaram em público estarem numa autodeclarada “lua de mel” com o governo Lula, teriam dito nos bastidores que acabar com as “saidinhas” violaria decisões anteriores da corte, que já reconheceu, em uma ação relatada pelo ministro Alexandre de Moraes, que também há um “estado de coisas inconstitucional” no sistema penitenciário brasileiro.

Para esses ministros, as “saidinhas” seriam uma maneira efetiva de reduzir a superpopulação carcerária e ressocializar os presos. Nada mais longe da verdade, como demonstrei neste artigo.

Em relação ao crime de fake news, depois do fracasso gigantesco do PL da Censura e do PL da Globo, o STF parece cada vez mais impaciente para sujar as próprias mãos e resolver o assunto por conta própria, definindo ele mesmo o que pode ou não ser dito nas redes sociais, qual a responsabilidade das plataformas e quais seriam as penas cabíveis para quem andar fora da linha.

Há pelo menos duas ações no Supremo que tratam do assunto, relatadas por Dias Toffoli e Luiz Fux, em que se discute a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet. Há uma pressão grande no Supremo para que essas ações sejam pautadas logo, e Toffoli já sinalizou na imprensa que deve liberar os processos para julgamento até o fim de junho. Com as derrotas do governo Lula nesta semana, o Supremo pode imprimir um passo ainda mais rápido para essas ações.

O artigo 19 do Marco Civil da Internet dispõe que os provedores de internet, websites e redes sociais só podem ser responsabilizados civilmente (por meio do pagamento de indenizações, por exemplo) por postagens e conteúdos ilícitos se não tomarem providências para a remoção desses conteúdos após decisão judicial. Acontece que uma ala do Supremo, liderada por Alexandre de Moraes, entende que as plataformas deveriam agir por conta própria para remover conteúdos considerados ilegais e impróprios, ou serem punidas por isso – como previa, aliás, o texto do derrotado PL da Censura.

O risco é que, por trabalharem por meio de algoritmos e não de análises individualizadas, a criança seja jogada ralo abaixo junto com a água suja do banho. É esperado que, durante o julgamento desse caso, o Supremo forme uma maioria para endossar esse entendimento, além de modular e criar novas regras para o debate nas redes, o que pode aumentar ainda mais a censura e a ameaça ao direito à liberdade de expressão no Brasil.

Pelo jeito, a “democracia inabalada” do governo Lula significa que, toda vez que o governo perder votações importantes no Congresso, ele vai tentar ganhar no tapetão do Judiciário, mandando às favas a separação entre os poderes, a democracia representativa e o poder do voto.

Não se ignora que o Supremo tem, sim, o poder e o dever de fazer o controle de constitucionalidade das leis, e que essa é também uma função importante na democracia. A crítica que fazemos, na direita, é contra o desvio de finalidade que o Supremo tem dado a esse poder/dever nos últimos anos, e que tem sido utilizado para atropelar as atribuições e prerrogativas do Legislativo enquanto o Supremo se anaboliza e concentra cada vez mais poder, tornando a nossa democracia disfuncional e cada vez mais parecida com uma magistocracia, uma ditadura de magistrados togados que nunca receberam nem um voto sequer nas urnas.

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