Houve um tempo em que afronta se lavava com sangue. Era assim entre iguais, entre aqueles que, mesmo em oposição, se reconheciam mutuamente como dignos do duelo. A honra ultrajada exigia reparação imediata, e essa lógica imperava entre nações soberanas quando sua dignidade era colocada em xeque. Mas os tempos mudaram, ao menos para alguns.
Há alguns dias, o Brasil foi alvo de uma afronta insuportável, de dimensões diplomáticas e institucionais alarmantes. O Secretário de Estado dos Estados Unidos declarou ser "muito provável" que o ministro Alexandre de Moraes, integrante da mais alta Corte do Judiciário brasileiro, venha a ser sancionado formalmente pelo governo norte-americano. Não se trata de uma crítica. Trata-se de uma ameaça concreta, com consequências graves e pessoais.
A sanção mencionada carrega implicações profundas, não apenas simbólicas, mas materiais: congelamento de bens sob jurisdição americana, bloqueio de cartões de crédito com bandeiras dos EUA, fim da concessão de visto de entrada no país, proibição de negociações com empresas e cidadãos americanos e até a suspensão de perfis em plataformas digitais de empresas sediadas em solo estadunidense, como Google, YouTube e outros serviços da mesma família corporativa. Trata-se, em suma, de uma exclusão sistemática da vida globalizada moderna — um banimento que ultrapassa fronteiras físicas e se infiltra no quotidiano digital.
Ora, qualquer cidadão minimamente atento deveria ter se perguntado: que país é esse que vê seu magistrado supremo, no exercício de suas funções, ser ameaçado de forma tão insolente e explícita, e apenas debate os danos pessoais que a sanção pode acarretar ao ministro?
Porque o cerne do problema não é o indivíduo Alexandre de Moraes, mas o que ele representa. O alvo é o Supremo Tribunal Federal (STF). É o Poder Judiciário. É, por extensão, a soberania do Estado brasileiro e a dignidade institucional de todos os seus cidadãos. A ofensa ultrapassa o homem e atinge a estrutura da República .Por meio de Moraes, é o Brasil que se vê retratado como indigno, como país sem lei ou ordem legítima, sujeito à tutela moral e política de outra nação.
Não é necessário simpatizar com o ministro, nem endossar todas as suas decisões — o debate democrático permite crítica a qualquer autoridade pública. Mas há uma linha que não pode ser cruzada sem que haja consequências, ao menos morais: a linha da submissão silenciosa a um insulto dessa magnitude. Quando uma potência estrangeira cogita sancionar um membro do Judiciário de outro país por suas ações no exercício da função, o que se está dizendo, de maneira tácita, mas eloquente, é que aquele país já não é considerado par. É um satélite, uma colônia errante no século 21.
No entanto, estamos de mãos atadas. As ferramentas de que dispomos para reagir são poucas e limitadas. Um protesto diplomático, talvez a convocação de nosso embaixador em Washington. Nada que realmente reverta o quadro ou restabeleça o equilíbrio. Entre iguais, lavava-se afronta com sangue. Não é mais o caso entre Brasil e Estados Unidos. Não temos os meios para enfrentar de igual para igual a potência que nos agride. Somos, neste momento, a parte fraca da equação.
Mais do que nunca, isso nos obriga a uma reflexão incômoda: que imagem temos projetado ao mundo? Que tipo de país somos, afinal, se aceitamos calados o rebaixamento institucional de nossas autoridades? A hostilidade americana não surgiu do nada — é sintoma de uma desordem mais profunda. Um país que se dobra internamente diante de chantagens, desinformação e golpismo não pode esperar respeito externo. De tanto brincar com coisa séria, fomos parar de cabeça pra baixo no centro de um mapa-múndi invertido.
A única atitude que nos resta é seguir adiante com firmeza institucional, sem recuar diante da pressão externa, sem hesitar em cumprir os ritos democráticos. O STF, encabeçado por ministros designados segundo o devido processo constitucional, precisa manter sua autonomia e levar até o fim o julgamento dos envolvidos na ousadia criminosa do 8 de Janeiro. Não se trata de vontade política — trata-se de dever institucional.
A integridade da República está em jogo. E embora não possamos lavar essa afronta com sangue, ainda podemos — e devemos — lavá-la com dignidade, coerência e firmeza democrática.
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