Opositores de Maduro fazem protestos em Maracay Rhonny Zamora. - Foto: CNN Newsource / Reprodução Milhões de venezuelanos convocados a votar no dia 28 de julho nas eleições presidenciais foram às urnas com a esperança de que o país siga um caminho de crescimento após vários anos de profunda crise econômica e social. Entre as 10 candidaturas destacam-se a do atual presidente, Nicolás Maduro, e a do candidato do grupo majoritário da oposição, Edmundo González.
Com 80% do votos apurados, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) apontou a reeleição do atual presidente, Nicolás Maduro. Ele teve apoio de 51,2% dos eleitores que compareceram às urnas — foram 5.150.092 votos –, segundo o órgão eleitoral, que é alinhado ao presidente. O principal opositor na disputa, Edmundo González, teve 44,2% — 4.445.978 votos.
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Em uma campanha polarizada, na qual não há muitos detalhes específicos sobre as propostas dos candidatos e não foi realizado um debate entre os concorrentes, analistas apontaram quais reformas seriam necessárias para consolidar a recuperação econômica e retornar aos níveis de produção e bem-estar anteriores à queda registrada a partir de 2014.
Essa queda incluiu hiperinflação, escassez de produtos básicos, um êxodo de milhões de migrantes e um alto grau de conflito social, com milhares de protestos contra o governo de Maduro, muitos dos quais foram reprimidos com violência.
Para Graciela Urdaneta, economista sênior da consultoria Ecoanalítica, o grande consenso é a necessidade de controlar a inflação e estabilizar o câmbio. “O governo vem implementando isso desde o ano passado. (…) Embora afete o crescimento econômico, é absolutamente necessário”, indicou.
A economista afirmou que é imperativo impulsionar a indústria petrolífera, considerando que a produção da PDVSA – a estatal venezuelana de exploração de petróleo -, embora tenha registrado um crescimento nos últimos meses, ainda extrai diariamente menos da metade dos barris em comparação com 2013, de acordo com números da OPEP, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
Nesse sentido, Urdaneta destacou que o governo “deu uma virada muito importante” ao permitir que o setor privado tenha maior participação na área petrolífera e afirmou que esse caminho deveria ser continuado ou ampliado.
Por outro lado, Urdaneta destacou que existem ideias com posições bastante divergentes entre o governo e a oposição, mas que considera cruciais, como a melhoria do marco regulatório para garantir maior transparência. “Enquanto houver tamanha opacidade nas informações, sem dados oficiais claros, é difícil atrair investimentos e ter credibilidade”, apontou.
Em meio a uma das fases mais agudas da crise, o Banco Central da Venezuela (BCV) passou mais de quatro anos sem divulgar relatórios sobre a situação econômica do país, até que em maio de 2019 registrou uma inflação de 130.060% para 2018 (várias vezes abaixo da estimativa do Fundo Monetário Internacional, que a calculou em 929.789,5%) e uma contração interanual do PIB de 22,5% para o terceiro trimestre de 2018. O BCV não voltou a divulgar relatórios oficiais sobre o PIB desde o final de 2022.
Urdaneta também considerou muito importante aumentar o crédito para pequenas e médias empresas e reduzir a carga tributária. “É uma economia que não pode crescer de forma sustentável. O crédito deve chegar à agricultura, à manufatura. A carga tributária sobre as empresas é extremamente elevada, o que dificulta operar e crescer”, afirmou.
Por sua vez, Marino González, doutor em Políticas Públicas e professor da Universidade Simón Bolívar (USB), afirmou que é urgente trabalhar em três crises que o país enfrenta: política, econômica e humanitária. “As três têm expressões sinérgicas, se retroalimentam”, afirmou.
O acadêmico enfatizou a necessidade de estabelecer um caminho para uma democracia plena. “A Venezuela é uma autocracia franca, considerada assim pela Universidade de Gotemburgo. A transição para uma democracia é um elemento crítico que não aparece nas propostas do governo nem nas que são consideradas como oposição. Um resultado eleitoral é apenas o início de um processo complicado que requer acordos inclusivos entre os setores que desejam essa democracia, que estejam convencidos de que o país precisa de uma mudança profunda, e aqueles setores que não estão participando ativamente, mas são importantes”, explicou González. Entre esses grupos, ele mencionou universidades, organizações não governamentais, academias e centros de organização social.
Quanto à situação econômica, González afirmou que a estrutura do país está enfraquecida, com leves sinais de recuperação. “A necessidade de aumentar a capacidade de gerar valor não tem sido considerada ou colocada em agenda. Como passar de uma economia totalmente improdutiva, dependente da receita petrolífera, para uma economia aberta e que produza valor”, destacou.
Dentro desse contexto, ele acrescentou que seria necessário discutir a política econômica para definir pontos-chave, como quem fornecerá o financiamento multilateral para os projetos de recuperação e em quanto tempo. “Não deveriam ser slogans isolados, mas parte de um programa coerente e bem estruturado”, recomendou.
González, que também é membro da Academia Nacional de Medicina, afirmou que é necessário enfrentar a crise humanitária. Ele disse que, caso um novo governo assuma em janeiro de 2025 — data estabelecida pela Constituição para o início do mandato presidencial —, “pelo menos dois anos de gestão pública deveriam estar concentrados em lidar com a situação alimentar, a crise crítica de saúde, educação e serviços públicos”, áreas de proteção social que ele considera ter “dificuldades críticas”.
Carmen Arteaga, doutora em Ciência Política e professora associada da Universidade Simón Bolívar, sustentou que o cenário político não oferece espaço para grandes consensos sobre os planos de governo. Além de concordar com a necessidade de maior transparência na administração pública, ela destacou que uma mudança profunda necessária envolve a segurança e os direitos humanos para “desmontar os mecanismos de repressão e violência interna, restaurando o estado de direito e a supremacia da lei”.
Entre 2017 e 2019, organizações civis registraram centenas de desaparecimentos forçados no contexto das protestas opositoras. A organização sem fins lucrativos Robert F. Kennedy Human Rights afirmou em 2020 que esses desaparecimentos foram “usados como uma ferramenta de repressão na Venezuela”. Após a publicação do relatório, o procurador-geral Tarek William Saab o desconsiderou e disse à CNN que a organização não tinha competência para avaliar a situação na Venezuela.
No entanto, também há alguns meses, em março, a Missão Independente da ONU alertou para uma reativação de métodos de repressão contra opositores na Venezuela, “uma repetição dos mesmos padrões de violação dos direitos humanos contra pessoas opositoras ou percebidas como tais”.
Em resposta, o chanceler da Venezuela, Yván Gil, disse que as acusações são infundadas e mentiras com o objetivo de promover uma mudança de regime.
Rumo da economia
Arteaga também destacou a necessidade de uma “mudança radical” para abandonar a política econômica monetarista que, segundo sua análise, é sustentada pela emissão de dinheiro e gera altos níveis de inflação. No entanto, ela acrescentou que, para todas as reformas, é necessário primeiro ter a vontade dos atores políticos, que é, segundo ela, o fator mais difícil de concretizar.
Urdaneta, da Ecoanalítica, saudou as mudanças do governo de Maduro em direção a uma maior abertura econômica e a injeção de dólares na economia, que, em sua opinião, permitiram maior estabilidade no câmbio.
Sobre uma possível privatização de empresas ou a eliminação de subsídios, ela disse que esses temas não assustam os eleitores como no passado. “Deixou de ser um fantasma. No final, na Venezuela, ocorreram muitas coisas que geraram pânico e percebemos que não têm um efeito pior do que a crise, como o aumento do preço da gasolina, que era um grande tabu e não causou grandes problemas. A prioridade é ter uma maior eficiência”, afirmou.
González, da USB, destacou alguns pontos que considera fundamentais para que a recuperação seja sólida. Segundo ele, deve ser concretizado “de maneira muito clara um acordo político inclusivo com uma grande capacidade de consensuar uma visão para o país” e que seja de médio ou longo prazo.
Além dessa base, ele afirmou que deve haver uma liderança política e de governo competente “que saiba lidar com a emergência e com os elementos estruturais”, para transmitir uma política sólida “capaz de atrair investimento multilateral e privado, e impulsionar a criação de empregos”.
Com esses dois fatores, declarou González, “muitos venezuelanos que adquiriram experiência poderiam considerar retornar”.
Isso porque, se a Venezuela conseguir corrigir o rumo econômico, a esperança de muitos eleitores também está em que a recuperação facilite o retorno de seus familiares, parte dos mais de 7 milhões de pessoas que deixaram o país nos últimos anos devido à crise econômica, entre outros motivos.
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