27/08/2022 às 11h16min - Atualizada em 27/08/2022 às 11h16min
Ministério Público de SC investiga atitude de escola com aluno autista
O garoto chegou em casa com uma plaquinha no pescoço: 'Não pode bater'
Sofia Mayer / Sabrina Quariniri
G1
'Não pode bater': Menino autista chega de escola com plaquinha no pescoço. Caso foi para no Ministério Público - Foto: Reprodução Uma mulher de 27 anos procurou o Ministério Público após o filho de cinco anos, que é autista, chegar da escola com um crachá com frases proibitivas pendurado no pescoço. O caso aconteceu em Jaraguá do Sul, no Norte catarinense. Na placa, há frases como "não pode bater" e "não pode empurrar" associadas a imagens que simulam uma briga. Uma foto do menino representa o agressor da discussão. Há um X vermelho indicando o que não deve ser feito por ele.
O caso aconteceu na segunda-feira (15) na Escola Municipal de Educação Básica Alberto Bauer. O MP confirmou que a denúncia chegou à promotoria na quinta-feira (25) e informou que os devidos encaminhamentos para notificar a unidade de educação já estão em trâmite.
A mãe, que preferiu não se identificar, conta que, ao ver o menino chegar em casa com o item pendurado, perguntou se apenas ele havia ganhado o crachá. Ele confirmou e a mãe ligou para a escola. "Eles confirmaram que só ele tinha recebido [o crachá]. À tarde, fui na escola e tive uma reunião com a diretora e o orientador. Eles explicaram que aquele era o "crachá do menino bonito". Então, quando ele fazia alguma coisa tiravam o crachá, quando não fazia, colocavam. Não entendi muito bem", relata. Segundo a mulher, o filho usou o crachá em outras ocasiões e, durante a conversa, os dois citaram que não era para ele ter saído de lá com a plaquinha. "Soube [do caso] por um descuido deles", completa.
A mãe diz que a criança foi diagnosticada com autismo nível 2 neste ano, mas que já era acompanhada por transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e atraso global do desenvolvimento, que pode comprometer, entre outras coisas, habilidades como cognição, linguagem, competências pessoais e sociais.
Ela ainda conta que o filho estuda no local desde o ano passado e que já havia recebido reclamações da escola sobre o comportamento do filho. "Ele é inocente, mas eu olhei aquilo e não sabia o que fazer. Pra gente que é mãe, dói, porque entendemos o significado. Eu já pensei que outras crianças iriam ver aquilo e se afastar dele. E a gente quer que ele se enturme, que aconteça a inclusão. Confesso que já pensei mais de uma vez de mudar ele de escola", relata.
Contraponto
Por nota, assinada pela diretora Célia Reichert Engelmann, a escola Escola Municipal Alberto Bauer informou que o objetivo da atividade chamada "cordão do menino bonito" é a interação entre alunos e "suporte nos momentos em que entra em crise". O texto, que identifica o menino autista como "aluno B", ainda cita que o garoto utiliza a pista visual o tempo todo durante o período escolar e quando sua ação vai contra ao que é combinado, o item é retirado "e então o aluno percebe o ato e rapidamente volta a regular-se para receber o cordão".
A escola cita que tanto a diretora quanto a professora responsável pela criação do crachá conversaram com a mãe e o padrasto do menino no dia 19 de agosto, quatro dias após o ocorrido. A reunião serviu para explicar o objetivo da metodologia e os "combinados com a turma e o aluno B", além de reforçar que as pistas visuais contribuem no "estímulo às habilidades da vida diária". "Porém, até mesmo antes da conversa ocorrida, a professora adotou outras imagens, palavras nas pistas visuais, buscando aprimorar ainda mais a cognição e a convivência social do aluno B. Durante a conversa, ficou expressamente clara a compreensão da família aos objetivos propostos e aos resultados das diversas práticas pedagógicas utilizadas pela escola", termina o texto.
"Inadmissível"
De acordo com Ivana Atanasio Dias, secretária de Educação do município, o uso de imagens é altamente pedagógico, mas o formato utilizado foi "totalmente inadequado". Ela informou à reportagem que procurou a diretora da escola e a professora responsável ao saber do caso.
"É inadmissível o que aconteceu. Não é porque foi com uma criança autista, isso não poderia ter acontecido com nenhuma criança. Este foi um reforço negativo, porque a criança não tem maturidade para entender. Eu, pessoalmente, fiz questão de ligar e me desculpa família", declara.
A secretária afirma que a rede municipal tem como metodologia o uso de pistas visuais e que, principalmente para crianças autistas, o uso de imagens é importante para auxiliar na prática pedagógica.
No entanto, o que se aconselha é que sejam feitos reforços positivos, como cartazes demonstrando onde guardar a mochila, onde pegar um livro ou pegar um brinquedo, por exemplo, que são ensinamentos de rotina e comportamento. Jamais ilustra-se atitudes negativas. "O crachá foi uma "invencionice" dela [professora], que achou que seria adequado. Em vez de ilustrar crianças brigando, a orientação é colocar se abraçando, demonstrando gentileza. E se estivesse na parede, não teria problema. O erro está em pessoalizar o aluno. Não se coloca as figuras no corpo da criança ou na carteira dela", explica a secretária.
Dias ainda diz que a professora responsável pela ação atua no município há 20 anos e é uma "profissional excelente", mas que cometeu um erro. Ivana assegura que as unidades de ensino de Jaraguá contam com psicólogos, fonoaudiólogos e pedagogos que utilizam a metodologia e que, recentemente, passaram por treinamento. A profissional, de acordo com Dias, reconheceu que errou e continuará dando aula na instituição.
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