Lula em reunião com governadores e autoridades em Brasília - Foto: Mauro Pimentel / AFP (09/01/2023) / Reprodução O terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) completa 16 dias dias nesta segunda-feira (16) colecionando uma série de atritos entre assessores próximos, nomeação de ministros questionada até entre os apoiadores do petista, quedas de braço entre as áreas política e econômica e crise na área de segurança depois dos atos de vandalismo registrados em Brasília no domingo (8).
Depois da depredação nas sedes dos Poderes, em Brasília, Lula gerou mal-estar com a cúpula do Governo do Distrito Federal ao intervir na administração da capital federal. Em resposta às manifestações extremistas, o presidente nomeou um interventor federal para gerir a segurança pública do DF até 31 de janeiro. Atestado de que, para Lula, a gestão de Ibaneis Rocha (MDB), governador da capital do país, falhou. Na mesma noite, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), afastou Ibaneis do comando do Governo do DF por 90 dias.
A oposição ao governo federal questiona a postura dos ministros da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, e da Defesa, José Múcio Monteiro, quanto às invasões às sedes dos Três Poderes. Horas antes dos estragos, no próprio domingo (8), Dino afirmou que estava em contato com governadores, inclusive da oposição a Lula. "Espero que não ocorram atos violentos e que a polícia não precise atuar", afirmou na ocasião.
A Força Nacional estava autorizada — pelo próprio Dino — a atuar na Esplanada dos Ministérios desde sábado (7), quando o ministro garantiu a "atuação constitucional do Governo do Distrito Federal". Não houve, entretanto, manifestações dos ministros quanto a ações da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) ou das Forças Armadas — incluindo o Batalhão da Guarda Presidencial, subordinado ao Exército, que deveria zelar pelo Palácio do Planalto.
A reação dos eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à vitória de Lula nas urnas chegou a ser chamada de "legítima" pelo ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. A fala, que classificou ainda os atos nas portas de instalações militares de democráticos, havia gerado mal-estar entre os aliados do petista mesmo antes do vandalismo do último domingo (8). Após os atos extremistas, a situação piorou.
Na semana passada, o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, foi contrariado publicamente por Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil. Lupi, durante a cerimônia de posse no cargo, afirmou que a última reforma da Previdência, aprovada em 2019, seria revista em conjunto com os sindicatos. Após repercussão negativa do mercado, Costa negou a informação e disse que não há nenhuma proposta do tipo em análise, no momento.
Ao fim da primeira semana do terceiro governo de Lula, a Petrobras perdeu ao menos R$ 12,6 bilhões em valor de mercado. A queda está intimamente ligada à determinação de que ministros revejam e interrompam processos de privatização de empresas públicas.
Também pesou contra as ações da estatal na semana passada a indicação do senador Jean Paul Prates (PT-RN) para comandar a companhia. O descontentamento do mercado com a escolha envolve a posição contrária do parlamentar à atual política de preços da Petrobras.
Contradições
Dino e Rui Costa colecionam momentos contraditórios. Em 21 de dezembro, o ministro da Justiça e Segurança Pública anunciou o delegado Edmar Camata para a chefia da Polícia Rodoviária Federal (PRF). No mesmo dia, no entanto, Dino voltou atrás na indicação, após a má repercussão entre aliados por causa de apoio declarado pelo delegado à Operação Lava Jato Dois dias depois, houve a veiculação de uma possível suspensão de um benefício criado por Bolsonaro, a modalidade do saque-aniversário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT), disse que ia propor a Lula o fim da medida, que, na avaliação de Marinho, reduz a reserva de dinheiro que poderia ser acessada em caso de demissão. A situação, no entanto, repercutiu mal entre o grupo petista por não ter sido negociada anteriormente.
Rui Costa sugeriu que dívidas de empresas condenadas no âmbito da Lava Jato sejam pagas por meio de investimentos em obras públicas. Para repactuar os acordos de leniência, o governo conversa sobre o assunto com o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU). No entanto, especialistas ouvidos pelo R7 alertam para a regulamentação e fiscalização da medida, porque a ação requer controle rigoroso para impedir novos atos de corrupção por agentes públicos e privados.
Na esteira de anúncios controversos, Rui Costa afirmou que não causa desconforto a proximidade da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, com o ex-PM preso por atuar como chefe de milícia no Rio de Janeiro e condenado por homicídio e associação criminosa. Mas a denúncia foi recebida com preocupação entre os aliados do presidente Lula pelo desgaste na imagem do governo federal.
Além da titular do Turismo, outra ministra de Lula é alvo de críticas. Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos foi condenada, em 2019, pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), por improbidade administrativa na contratação de gerenciamento da iluminação pública de Olinda (PE) quando era prefeita do município. Na época, a defesa dela disse que não houve prejuízo ao patrimônio público municipal e que a sentença da Justiça reconheceu que Luciana não recebeu nem desviou dinheiro público.
Aliança com opositores
Ao menos quatro ministros de Lula foram favoráveis ao impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. À época, André de Paula, agora titular da Pesca e Aquicultura, e Juscelino Filho, chefe da pasta das Comunicações, eram deputados federais e votaram a favor do impedimento da petista.
Simone Tebet, atual ministra do Planejamento e Orçamento, era senadora e também concordou com a deposição de Dilma. Carlos Fávaro, titular da Agricultura e Pecuária, era vice-governador de Mato Grosso à época da votação do impeachment, mas participou de manifestações populares pelo impedimento de Dilma, inclusive com postagens nas redes sociais.
Os três parlamentares que, à época, foram favoráveis à deposição de Dilma também votaram pela instauração do teto de gastos, modificado por Lula ainda na fase de transição por meio da PEC (proposta de emenda à Constituição) do estouro.
Em 2016, em reação ao impeachment, aliados de Dilma e de Lula chamaram de "golpe" o processo que instituiu Michel Temer (MDB) como presidente. Na mesma linha, os apoiadores dos petistas, inclusive de movimentos sociais, classificaram a medida que limitava os gastos públicos de "PEC do fim do mundo" e "da morte".
Emendas de relator
Apesar das críticas ao orçamento secreto, pela falta de transparência e regras claras, Lula nomeou ministros que se beneficiaram de verbas do dispositivo em 2022. Ao menos seis indicados utilizaram R$ 221 milhões das RP9, como são chamadas as emendas de relator.
São eles: Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ), Turismo; Juscelino Filho (União Brasil-MA), Comunicações; André de Paula (PSD-PE), Pesca e Aquicultura; Alexandre Silveira (PSD-MG), Minas e Energia; Carlos Fávaro (PSD-MT), Agricultura e Pecuária; e Waldez Góes (PDT-AP, em migração para o União Brasil), Integração e Desenvolvimento Regional. Em 19 de dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou o orçamento secreto inconstitucional.
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