Os brasileiros que deixaram o país para viver na Irlanda cresceram mais de 430% nos últimos anos. Na foto, Edu Giansante, na Irlanda. - Foto: Arquivo pessoal / Reprodução Os brasileiros que deixaram o país para viver na Irlanda cresceram mais de 430% nos últimos anos. Segundo o Itamaraty, o número de imigrantes brasileiros no país europeu mais que quintuplicou entre 2018 e 2022: saltou dos 15 mil para cerca de 80 mil. Imigrantes ouvidos pela reportagem apontam fatores como bons salários e ofertas de emprego como atrativos para imigração. Apesar disso, eles relatam as dificuldades que encontraram no país.
Na última semana, o caso do entregador brasileiro João Henrique Thomaz Ferreira, atropelado por um carro da polícia irlandesa colocou a imigração brasileira à Irlanda em evidência. Após o acidente, João precisou amputar a perna direita e está internado.
Testemunhas e amigos de João afirmam que o atropelamento foi proposital e cobram rigor nas investigações e na justiça. O caso desencadeou um protesto em Dublin, capital da Irlanda, com adesão de muitos brasileiros e entregadores de comida, função bastante exercida por estrangeiros e, inclusive, pelo próprio João.
A categoria relata que é alvo constante de violência na Irlanda. Agressões, roubos e perseguição por parte de gangues irlandesas são frequentes durante o trabalho. Os imigrantes ouvidos pela reportagem afirmam que diversos fatores ajudam a explicar o aumento de brasileiros morando na Irlanda.
Os fatores mais citados foram: visto de trabalho e de estudante relativamente fácil em comparação a outros países desenvolvidos do exterior; imigração mais acessível em relação a outros países desenvolvidos do exterior; a possibilidade de trabalhar até 20 horas por semana com visto de estudante, o que não é permitido em outros países que recebem muito intercambistas, como a Austrália; maior oferta de empregos em relação ao Brasil; salário maior em relação ao Brasil; o fato de ser um país europeu e a possibilidade de conhecer os outros países do continente.
Fundador do ‘edublin’, portal dedicado a brasileiros que moram ou querem visitar ou morar na Irlanda, Eduardo Giansante chegou ao país muito antes desse aumento de imigração.
De São Paulo (SP), ele foi para a Irlanda em 2008 para estudar inglês e morou no país europeu até setembro deste ano, quando se mudou para a Califórnia, nos Estados Unidos.Giansante explica que a facilidade de chegar à Irlanda e trabalhar, além do salário muito melhor em relação ao país, são os principais atrativos para brasileiros.
“Conseguir o visto de estudante ou de trabalho para chegar à Irlanda não é difícil como em outros países, que complicam um pouco esse processo. Além disso, o país não é considerado atrativo para os próprios europeus, o que deixa abertas oportunidades no mercado de trabalho, que pode ser preenchido pelos brasileiros e outros imigrantes. Até sem inglês é possível trabalhar, embora os postos sejam menos valorizados”, afirma.
“Outro atrativo é o salário. O salário mínimo na Irlanda está em € 11,30 por hora. Já é um valor superior ao do Brasil, mas isso fica ainda mais evidente tendo em vista o poder de compra. Você supre as suas necessidades com o que ganha muito mais facilmente do que no Brasil”, completa.
Morando na Irlanda desde o final de 2021, o jovem João Maurício Martins, de 25 anos, se mudou para o Dublin, capital do país, com visto de estudante para aperfeiçoar a língua inglesa. Ele é de Guaratinguetá, no interior de São Paulo.
Como a lei irlandesa permite que estudantes estrangeiros trabalhem até 20 horas por semana, João decidiu procurar um emprego em busca de dinheiro e a primeira oportunidade que apareceu foi como entregador de comida.
A experiência, entretanto, não foi positiva. De acordo com ele, a perseguição contra estrangeiros que exercem a função no país é muito grande e coloca em cheque a segurança das pessoas que optam por trabalhar com entrega.
“Eu acho que o grande problema com estrangeiros aqui é por parte das gangues com os entregadores de comida, que são sempre brasileiros ou de outros países da América Latina. A gente vive uma guerra aqui entre essas gangues e os deliveries. Tem muito roubo de bicicleta e moto. As gangues costumam jogar pedras e ovos nos entregadores. ”
“Algumas vezes (essas gangues) fazem pedidos como se fossem clientes, mas para fazer emboscada para o entregador. Passei por situações que tive medo. Já fui perseguido por um grupo de 10 a 15 adolescentes que queriam me derrubar da bicicleta para me roubar”, completa Martins.
Fora os casos quando trabalhou como entregador, João não sofreu nenhum preconceito no país. Agora como garçom, após ter abandonado a entrega por medo, ele afirma ter presenciado pouquíssimos casos de discriminação. “Em trabalhos em empresas, restaurantes e bares eu presenciei poucos casos de xenofobia. Os irlandeses como um todo já estão acostumados (com imigrantes)”, conta.
Natural de Itajaí (SC), Ariane Feller, de 34 anos, mora na Irlanda com o marido desde fevereiro de 2018, quando o casal se mudou após conseguir cidadania italiana, que dá direito a moradia e trabalho legal no país europeu. Contadora, Ariane trabalha com finanças, enquanto o marido Ailton enfrenta os desafios como entregador de comida. Ela confirma os casos de violência sofridos pela categoria.
“Meu marido sofre muito com isso. São gangues de jovens irlandeses que roubam e furtam motos e bicicletas de entregadores. Eles não vendem, apenas destroem, colocam fogo. Passam em frente ao restaurante e derrubam as motos para arranhar. É uma situação complicada”, relata.
Apesar disso, o salário é considerado bom. De acordo com a catarinense, um entregador recebe cerca de € 800 euros com moto e cerca de € 600 com bicicleta, trabalhando oito horas por dia e folgando no final de semana. Como algumas pessoas optam por trabalhar mais de oito horas por dia e também aos finais de semana, o salário pode chegar a € 1,3 mil por semana, o que dá quase R$ 7 mil na conversão atual.
Dona de uma página no Instagram chamada 'Irlandapontocom', dedicada a brasileiros que vivem na Irlanda, a Ariane afirma que, além da perseguição a entregadores, outros crimes são raros, mas vêm aumentando no país.
“A gente vê aumentar alguns casos por aqui, embora a criminalidade nem se compare à do Brasil. O principal é roubo praticado por essas gangues, às vezes no centro de Dublin, e que a polícia não faz nada, principalmente quando as vítimas são imigrantes”, diz Ariane.
Estabilidade no trabalho
Apesar dos problemas com os entregadores, o trabalho de forma geral é muito bem avaliado pelos brasileiros que moram na Irlanda. Além da facilidade em encontrar um posto e do salário, Eduardo Giansante afirma que a cultura do trabalho no país é extremamente positiva.
“A Irlanda é maravilhosa nesse sentido, com muita segurança em relação ao trabalho. Muito raramente se é demitido, a não ser por justa causa. Se você não estiver performando, por exemplo, a empresa te testa em outras funções até que você se adapte. Há uma estabilidade muito grande, muito suporte do governo, incentivos, apoio, entre outros”, cita.
A catarinense Ariane confirma e completa afirmando que os brasileiros são muito bem-vistos pelos irlandeses no meio profissional. “Os brasileiros vêm para trabalhar e ganhar dinheiro, então trabalham muito bem. Isso é valorizado pelos irlandeses, que gostam de nos contratar ``. conta.
Lazer
Visitada por milhares de turistas durante o ano, a Irlanda tem muitas opções de lazer, segundo os brasileiros. Moradora de Dublin desde 2013, a paulista Sandra Maria dos Santos chegou ao país após uma oportunidade de trabalho e vive no exterior desde então.
Ela conta que sentiu a chegada de mais brasileiros nos últimos anos, principalmente com o fim da pandemia, quando o país aumentou o número de contratações. De acordo com a Sandra, os brasileiros gostam de aproveitar as opções de lazer oferecidas na Irlanda.
“As melhores opções estão no verão. O país tem muitos festivais de rua, praças e parques, que acabam sendo prejudicados pelo inverno. Mas os ‘pubs’, que são como bares, são muito fortes aqui. Tem também opções como museus, monumentos, zoológicos, e atrações relacionadas à ilha, como penhascos, que dá para visitar”, afirma.
Crise imobiliária
Uma dificuldade narrada pelos brasileiros na Irlanda é a crise imobiliária que o país enfrenta há anos. O principal motivo é a baixa oferta em relação à alta procura, motivada principalmente pelo aumento de imigrantes na ilha.
Também natural de São Paulo, a Talita Dioni, de 35 anos, conheceu o país por meio do intercâmbio que fez em 2011 e passou a morar definitivamente em 2017. Depois de passar por diversos postos diferentes, a Talita hoje trabalha como terceirizada do governo irlandês, atendendo clientes justamente para o setor de aluguel. De acordo com ela, o aluguel aumentou muito no país.
“Tudo aumentou muito. Quando eu cheguei à Irlanda, pagava € 315 por mês por um quarto em uma casa bem localizada, que dava para ir a pé ao centro de Dublin. Hoje pago € 1,8 mil em uma casa com dois quartos, mas não tão bem localizada. As diárias em hotéis subiram muito também, estão mais do que o dobro do preço em relação a quando cheguei”, diz.
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