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14/05/2022 às 23h01min - Atualizada em 14/05/2022 às 23h01min

A privatização da Petrobras não garante queda nos preços dos combustíveis

Especialistas avaliam que não há relação direta entre a privatização e os preços

Gabriela Ruddy
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2022/05/13/o-preco-da-gasolina-e-do-diesel-vao-cair-se-a-petrobras-for-privatizada-entenda.ghtml
Reprodução
A proposta de fazer estudos para uma eventual privatização da Petrobras, anunciada esta semana pelo novo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, não garante que os preços dos combustíveis (gasolina e diesel) vão cair no Brasil, segundo especialistas. Tudo depende da flutuação do preço do petróleo, das margens de refino e do câmbio. Especialistas consultados pelo Valor dizem que não há relação direta entre a privatização da Petrobras e os preços dos combustíveis.

Mas a venda da empresa pode, sim, assegurar maior concorrência nos segmentos de refino e de distribuição de derivados. Entenda os impactos que uma eventual privatização da Petrobras teria no mercado brasileiro de combustíveis:

Se a Petrobras for privatizada, os preços dos combustíveis vão cair? Não há garantias que isso ocorra. Tudo depende da flutuação do preço do petróleo, das margens de refino e do câmbio. Especialistas dizem que não há relação direta entre a privatização da Petrobras e os preços dos combustíveis. Os preços dos derivados de petróleo, como gasolina e diesel, seguem as cotações internacionais. Significa que têm, como referência, os preços dos produtos no mercado global, em dólar . Outras variáveis que pesam no preço são as atividades de distribuição e revenda; a adição de biocombustíveis e, por fim, os impostos.

Especialistas concordam que a privatização da Petrobras por si só não seria determinante para a redução dos preços dos combustíveis, que são commodities, como a soja e o minério de ferro, por exemplo, que seguem os preços do mercado internacional.

A demanda doméstica de combustíveis no Brasil é atendida pela produção nacional, a partir de refinarias instaladas no país, a maioria delas da Petrobras, e pela importação. ‘Não há como praticar preços artificiais', diz um executivo do setor. Se isso for feito, como ocorreu no passado, o risco é de prejuízos para a Petrobras e de falta de abastecimento.

Haveria, porém, formas indiretas de reduzir os preços finais aos consumidores. Uma delas seria usar os recursos oriundos da privatização para formar um fundo que permita reduzir os impostos cobrados sobre os combustíveis, disse uma fonte da indústria.

Especialistas dizem que o que vai levar, efetivamente, a mudanças estruturais nesse mercado é o aumento da competição no setor de refino, com a entrada de novos agentes.

A Petrobras conduz um programa para vender oito refinarias que correspondem à metade da capacidade de processamento da empresa. Mas a iniciativa tem avançado lentamente. Só a Refinaria de Mataripe (BA) foi vendida até agora, sendo comprada pelo fundo Mubadala por US$ 1,8 bilhão.

‘O importante é vender os ativos de refino separadamente. Melhor do que vender a Petrobras é ter mais concorrentes no mercado. Com o programa de desinvestimentos em andamento, se garante mais competição e aí sim poderemos ter maior estabilidade nos preços dos combustíveis’, afirma o sócio da consultoria Leggio, Marcus D’Elia.

Como são formados os preços dos combustíveis no Brasil e qual é o peso da Petrobras nesta conta? No caso da gasolina, segundo o próprio site da Petrobras, para o período de 1º a 7 de maio de 2022, a composição dos preços estava assim: R$ 2,81 correspondentes à parcela da estatal (incluindo custos de produção e importação); R$ 1,05 dizia respeito ao custo do etanol anidro adicionado ao combustível; R$ 1 à distribuição e revenda; R$ 1,75 ao imposto estadual (ICMS) e R$ 0,69 a outros impostos (CIDE e PIS/PASEP e COFINS).

No diesel, a composição, no mesmo período, era a seguinte: R$ 4,07 da Petrobras; R$ 1,22 para a revenda e distribuição; R$ 0,70 do custo do biodiesel adicionado ao diesel e R$ 0,79 do ICMS.

O sócio da Leggio afirma que um dos pontos que mais pesam sobre os preços finais é a desvalorização do câmbio. A queda do real frente ao dólar faz com que os preços do mercado internacional, que estão altos, tenham ainda mais impacto nos preços finais dos produtos na moeda brasileira. ‘Nosso câmbio está muito desvalorizado em relação ao dólar. Isso faz com que todas as outras parcelas da composição dos preços se multipliquem. O fator que efetivamente dá essa sensação de preços mais caros é o câmbio desvalorizado’, diz.

Com a Petrobras privatizada, haveria maior concorrência no mercado de refino e distribuição? O mercado de distribuição hoje no Brasil já é pulverizado. De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP) de março, 27,5% do diesel consumido no mês foi distribuído pela Vibra Energia (antiga BR-Distribuidora), outros 20,7% pela Raízen e 19,3% pela Ipiranga, com os restantes 32,5% sendo atendidos por diversas empresas menores, de atuação local.

No caso do refino, o cenário é diferente. A maior parte da capacidade de produção de derivados de petróleo no país é da Petrobras. A exceção é a Refinaria de Mataripe, vendida no ano passado e que, em março, entregou 13% da produção nacional de derivados, segundo a ANP. Há ainda algumas refinarias de pequeno porte em mãos privadas.

Nesse cenário, uma medida que poderia ajudar a reduzir os preços seria uma maior competição no mercado de refino, aponta D’Elia. Segundo ele, isso será possível com a venda das refinarias da Petrobras. ‘É a competição que faz os preços se estabilizarem. É o livre mercado que vai dar mais competitividade aos preços dos combustíveis’, diz.

Qual seria o melhor modelo de venda para a Petrobras? D’Elia, da Leggio, é contrário à venda da empresa em modelo de ‘porteira fechada'. Privatizar a Petrobras e mantê-la com um único dono privado é muito pior do que dividir os ativos da empresa e vendê-los a diferentes agentes do mercado. Transformar a empresa inteira em uma empresa completamente privada com um dono só, na minha opinião, seria pior do que a situação atual. A ação correta é vender os ativos e criar competição no mercado de refino’, afirma.

No mercado financeiro, há, entre analistas, quem entenda que o melhor modelo é a União se desfazer, inicialmente, de um pequeno lote de ações da companhia para reduzir a participação do governo abaixo de 50% das ações com direito a voto. A seguir o governo poderia listar a empresa no Novo Mercado da B3 , ficando com 30% do capital total, e incluir cláusula de ‘poison pill’ para evitar uma eventual tomada hostil da empresa por um concorrente.

Nessa operação de mercado, a Petrobras se tornaria privada tendo que, paralelamente, negociar com o CADE a venda de ativos no refino, na distribuição de gás e em outros segmentos para deixar de ser ‘dominante’.

Desde 2015, a Petrobras conduz um processo de venda de ativos que incluiu desinvestimentos de campos de exploração e produção terrestres e em águas rasas, ativos de gás e infraestrutura e de geração de energia elétrica, além das refinarias.

Esse modelo permitiu a entrada de novos agentes em diversos mercados no país e ampliou a competição, sobretudo na exploração e produção de petróleo e gás. Um eventual fatiamento da empresa precisará garantir que ativos de uma mesma categoria sejam vendidos de forma separada, de forma a garantir a competição entre diferentes empresas em um mesmo mercado.

Por que a atração de novos agentes para o setor de refino está demorando? Das oito refinarias colocadas à venda pela Petrobras, apenas a Rlam foi vendida. A Petrobras assinou contratos para a venda de outras duas unidades, a SIX, no Paraná, e a Reman, no Amazonas, mas as transações ainda não foram concluídas. Segue em negociação a Regap, em Minas Gerais.

Fracassaram as tentativas de vender a Rnest, em Pernambuco, e a Refap, no Rio Grande do Sul, além da Repar, no Paraná. A empresa pretende relançar os processos de venda para essas unidades no futuro. ‘Estamos num momento de bastante volatilidade no mercado como um todo, esse é um desafio adicional’, disse o diretor financeiro da Petrobras, Rodrigo Araujo, em teleconferência com analistas, na semana passada.

As incertezas e ruídos no mercado com as críticas à companhia prejudicam o processo de venda dos ativos de refino em andamento. Isso dificulta o processo de venda porque cria incertezas e faz com que potenciais investidores interessados na compra das refinarias prefiram aguardar até o cenário se estabilizar. Quanto mais incerteza, mais dificuldade para avançar na venda das refinarias’, diz D’Elia.

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